O denominado desvio de função não se confunde com direito de equiparação salarial, cujo instituto será abordado em matéria específica.
Para entender o desvio de função é importante compreender a diferença entre Função e o Cargo, no Direito do Trabalho[1]. É que a Função está ligada à atividade real do trabalhador.
É possível que o trabalhador esteja lotado[2] em um cargo criado pra determinada atividade laboral, mas exerça, contudo, uma função diversa daquela para a qual o cargo foi criado. Há pois o desvio de uma linha de conduta previamente estipulada. Desviou-se daquilo que foi contratado.
Ao Poder Judiciário, mediante pedido do trabalhador, cumpre realinhar a conduta e compensar o desvio. Corrigir o que as partes alinharam.
O Desvio de Função é uma ilegalidade que decorre de um descumprimento contratual e provoca um desiquilibro na relação havida entre os contratantes.
Quando o empregador sai de sua linha de conduta e determina que outro rumo seja seguido pelo trabalhador, ele pode estar sujeito a pelo menos duas consequências comuns: (1) dever de reestabelecer a linha anterior se lhe for exigido pelo trabalhador e (2) pagar o valor da remuneração condizente com a função real exercida. É claro que outros reflexos podem ocorrer em situações particulares, como o dever de indenizar eventuais prejuízos, materiais ou morais, entre outros reflexos de ordem trabalhista.
No decorrer de nossa experiência com as relações de trabalho, verificamos que o desvio de função tem ocorrido com certa frequência entre os cargos operacionais, de execução, em relação aos cargos técnicos. Isto ocorre quando o trabalhador uma função operacional em determinado cargo operacional mas, por ter conhecimento técnico em determinada área ou tê-lo adquirido, é aproveitado para aquela função técnica, quando estão vagos.
Fatos relacionados a este tipo de conduta é com certa frequência ocorrida em empresas públicas, designando-se o trabalhador para a função de um outro cargo que não aqueles para o qual foi lotado, designado, como forma de suprir a falta de mão-de-obra em determinado setor, conter a contabilização de despesas e, ainda, suprir as dificuldades decorrentes da demora provocada pela burocracia necessária ao preenchimento da vaga; do cargo.
Em caso recente patrocinado por este advogado, a empresa SABESP – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo foi condenada ao pagamento de diferenças salariais e danos morais por designar um operário para exercer as funções técnicas, próprias do cargo de Técnico de Sistemas de Saneamento. Neste caso específico, dentre outros que patrocinamos, o operador formou-se em curso Técnico de Sistemas de Saneamento passando a exercer a função de maior complexidade e responsabilidade, porém sem a contraprestação que estabeleceria o equilíbrio[3] contratual.
O desvio de função não implica apenas em prejuízos materiais ao trabalhador, em decorrência da falta de pagamento de salário condigno com a atividade para a qual foi designado, mas notadamente prejuízos psíquicos decorrentes do desrespeito à isonomia, da desigualdade de qualidade de vida em relação aos colegas, podendo até mesmo configurar em assédio moral, conforme o caso.
Por fim, o desvio de função não garante, ao trabalhador, a manutenção das funções decorrentes do desvio, mesmo que lhes forem mais benéficas em sua avaliação pessoal ou financeira, podendo o empregador voltar à linha desviada a qualquer momento, antes ou após eventual decisão judicial, salvo, ao nosso sentir, nos casos de estabilização convalidadas pelo decurso do tempo, como decidiu o Ministro Relator Ministro GILMAR MENDES[4], relativo a cargo público, tese confirmada pelo Eminente jurista, o Ministro José Antonio DIAS TÓFFOLI, na ADI 807 – STF, julgada em 07.02.2019. Porque tem como alicerce o Princípio da Segurança Jurídica, entendemos que a estabilização beneficia os trabalhadores de empresas privadas.
Por fim anotamos que o desvio de função não se confunde como o acúmulo de funções, a qual garante um adicional a ser arbitrado pelo Justiça do Trabalho, embora possa coexistir em uma mesma situação fática, quando a linha principal é desviada acumulando-se à nova função outras as quais também não lhe diga respeito.
– Como devo fazer para buscar meus direitos? Deve o trabalhador procurar um advogado que conheça a matéria, para que identifique se as funções que você vem exercendo ou exerceu estão fora da linha contratual; ou se se tratam apenas de funções acumuladas àquelas principais alinhadas com o seu patrão; ou, ainda, se tais atividades estão compreendidas como simples Variação Normal do Contrato de Trabalho, como, por exemplo, o caso da copeira que auxilia na limpeza de salas empresariais ou efetua o controle de estoque. Nesta última hipótese não haverá direito algum a receber, pois é normal a variação de funções compatíveis com o cargo e com as atividades principais do trabalhador.
Artigo Rafael M. Cassebe Tóffoli – OAB/SP 213.970.
[1] Na Língua Portuguesa Clássica, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Dicionário, 5ª Ed., p. 993, para a compreensão do público em geral, equipara cargo a função. Adiante, contudo, define a função como a “Prática ou exercício de cargo […]”.
[2] “7. Colocar funcionário ou empregado em (determinado setor, repartição, etc)”. Por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, 5ª Ed., p. 1287, em Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
[3] Dados pessoais e processuais preservados por sigilo profissional.
[4] Mandado de Segurança n. 22.357, STF – PLENO, DJ 05-11-2004.
O denominado desvio de função não se confunde com direito de equiparação salarial, cujo instituto será abordado em matéria específica.
Para entender o desvio de função é importante compreender a diferença entre Função e o Cargo, no Direito do Trabalho[1]. É que a Função está ligada à atividade real do trabalhador.
É possível que o trabalhador esteja lotado[2] em um cargo criado pra determinada atividade laboral, mas exerça, contudo, uma função diversa daquela para a qual o cargo foi criado. Há pois o desvio de uma linha de conduta previamente estipulada. Desviou-se daquilo que foi contratado.
Ao Poder Judiciário, mediante pedido do trabalhador, cumpre realinhar a conduta e compensar o desvio. Corrigir o que as partes alinharam.
O Desvio de Função é uma ilegalidade que decorre de um descumprimento contratual e provoca um desiquilibro na relação havida entre os contratantes.
Quando o empregador sai de sua linha de conduta e determina que outro rumo seja seguido pelo trabalhador, ele pode estar sujeito a pelo menos duas consequências comuns: (1) dever de reestabelecer a linha anterior se lhe for exigido pelo trabalhador e (2) pagar o valor da remuneração condizente com a função real exercida. É claro que outros reflexos podem ocorrer em situações particulares, como o dever de indenizar eventuais prejuízos, materiais ou morais, entre outros reflexos de ordem trabalhista.
No decorrer de nossa experiência com as relações de trabalho, verificamos que o desvio de função tem ocorrido com certa frequência entre os cargos operacionais, de execução, em relação aos cargos técnicos. Isto ocorre quando o trabalhador uma função operacional em determinado cargo operacional mas, por ter conhecimento técnico em determinada área ou tê-lo adquirido, é aproveitado para aquela função técnica, quando estão vagos.
Fatos relacionados a este tipo de conduta é com certa frequência ocorrida em empresas públicas, designando-se o trabalhador para a função de um outro cargo que não aqueles para o qual foi lotado, designado, como forma de suprir a falta de mão-de-obra em determinado setor, conter a contabilização de despesas e, ainda, suprir as dificuldades decorrentes da demora provocada pela burocracia necessária ao preenchimento da vaga; do cargo.
Em caso recente patrocinado por este advogado, a empresa SABESP – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo foi condenada ao pagamento de diferenças salariais e danos morais por designar um operário para exercer as funções técnicas, próprias do cargo de Técnico de Sistemas de Saneamento. Neste caso específico, dentre outros que patrocinamos, o operador formou-se em curso Técnico de Sistemas de Saneamento passando a exercer a função de maior complexidade e responsabilidade, porém sem a contraprestação que estabeleceria o equilíbrio[3] contratual.
O desvio de função não implica apenas em prejuízos materiais ao trabalhador, em decorrência da falta de pagamento de salário condigno com a atividade para a qual foi designado, mas notadamente prejuízos psíquicos decorrentes do desrespeito à isonomia, da desigualdade de qualidade de vida em relação aos colegas, podendo até mesmo configurar em assédio moral, conforme o caso.
Por fim, o desvio de função não garante, ao trabalhador, a manutenção das funções decorrentes do desvio, mesmo que lhes forem mais benéficas em sua avaliação pessoal ou financeira, podendo o empregador voltar à linha desviada a qualquer momento, antes ou após eventual decisão judicial, salvo, ao nosso sentir, nos casos de estabilização convalidadas pelo decurso do tempo, como decidiu o Ministro Relator Ministro GILMAR MENDES[4], relativo a cargo público, tese confirmada pelo Eminente jurista, o Ministro José Antonio DIAS TÓFFOLI, na ADI 807 – STF, julgada em 07.02.2019. Porque tem como alicerce o Princípio da Segurança Jurídica, entendemos que a estabilização beneficia os trabalhadores de empresas privadas.
Por fim anotamos que o desvio de função não se confunde como o acúmulo de funções, a qual garante um adicional a ser arbitrado pelo Justiça do Trabalho, embora possa coexistir em uma mesma situação fática, quando a linha principal é desviada acumulando-se à nova função outras as quais também não lhe diga respeito.
– Como devo fazer para buscar meus direitos? Deve o trabalhador procurar um advogado que conheça a matéria, para que identifique se as funções que você vem exercendo ou exerceu estão fora da linha contratual; ou se se tratam apenas de funções acumuladas àquelas principais alinhadas com o seu patrão; ou, ainda, se tais atividades estão compreendidas como simples Variação Normal do Contrato de Trabalho, como, por exemplo, o caso da copeira que auxilia na limpeza de salas empresariais ou efetua o controle de estoque. Nesta última hipótese não haverá direito algum a receber, pois é normal a variação de funções compatíveis com o cargo e com as atividades principais do trabalhador.
Artigo Rafael M. Cassebe Tóffoli – OAB/SP 213.970.
[1] Na Língua Portuguesa Clássica, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Dicionário, 5ª Ed., p. 993, para a compreensão do público em geral, equipara cargo a função. Adiante, contudo, define a função como a “Prática ou exercício de cargo […]”.
[2] “7. Colocar funcionário ou empregado em (determinado setor, repartição, etc)”. Por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, 5ª Ed., p. 1287, em Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
[3] Dados pessoais e processuais preservados por sigilo profissional.
[4] Mandado de Segurança n. 22.357, STF – PLENO, DJ 05-11-2004.